quarta-feira, 23 de maio de 2012

A História de Fernão Capelo Gaivota


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Uma gaivota nunca contesta o conselho do bando, mas a voz de Fernão ergueu-se gritando:
_ Irresponsabilidade? Meus irmãos! Quem é mais responsável do que uma gaivota que descobre e desenvolve um significado, um propósito mais elevado na vida? Passamos mil anos lutando por cabeças de peixe, mas agora temos uma razão para viver, para aprender, para descobrir, para sermos livres!

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Fernão Gaivota passou o resto dos seus dias sozinho, mas voou muito além dos Penhascos Longínquos. A solidão não o entristecia. Entristecia-o que as outras gaivotas se tivessem recusado a acreditar na glória do vôo que as esperava. Recusaram-se a abrir os olhos e a ver.
Aprendia cada vez mais. Aprendeu que um eficiente mergulho a grande velocidade lhe dava o peixe raro e saboroso que viviatrês metros abaixo da superfície do mar. Já não precisava de barcos de pesca nem de pão duro para viver. Aprendeu a dormir no ar, estabelecendo um percurso noturno pelo vento largo, cobrindo cento e cinquenta quilômetros desde o acaso até a aurora. Utilizando o mesmo controle interior, voou atravéz de nevoeiros cerrados e subiu acima deles para céus estonteantes de claridade... enquanto qualquer outra gaivota ficava em terra, conhecendo apenas a neblina e chuva. Aprendeu a dominar os altos ventos do continente e a jantar ali os delicados insetos.
O que outrora desejara para o bando tinha-o agora só para si. Aprendera a voar e não lamentava o preço que pagara por isso. Fernão Gaivota descobriu que o tédio, o medo e a ira são razões por que a vida de uma gaivota é tão curta e, sem isso a perturbar-lhe o pensamento, viveu de fato uma vida longa e feliz.
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(Lembrando que a felicidade é apenas um estado de espírito.)
Trechos da primeira parte de um lindo livro dos anos 70, que um dia me falou sobre liberdade.

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